Não mergulhar nas nossas vulnerabilidades o tempo necessário para conhecer e abraçar os processos inevitáveis da vida nos torna impotentes e frágeis diante deles.
Antes de qualquer coisa é importante esclarecer que o objetivo desse texto não é romantizar nem naturalizar abusos e violências. Tais situações devem sempre ser combatidas! Esse texto tem por objetivo falar sobre os desafios presentes nos processos de crescimento.
Quando as lagartas estão prestes a se transformar em borboletas elas entram em um profundo processo que envolve o isolamento, o exílio e a solidão. Antes desse processo a única tarefa da lagarta é se alimentar e reservar nutrientes. Quando já existe reserva suficiente a ponto dela não conseguir nem mesmo se mover por causa de seu peso ela pára em um galho, de cabeça pra baixo (de uma perspectiva totalmente diferente da que ela tinha até agora), se recolhe e se entrega ao processo, ao silêncio, ao tédio, e à solidão.
No silêncio de seu casulo células minúsculas que os cientistas chamam de “células imaginárias” começam a atuar.
Essas células são completamente diferentes das outras células no corpo, carregando informações totalmente novas.
A princípio, o sistema imunológico da lagarta percebe essas novas células como inimigas e as atacam. Uma verdadeira batalha é travada entre células antigas e células novas, o velho e o atual.
Se o processo não for interrompido as novas células vencem e instauram um organismo totalmente novo dotados de características e habilidades antes inimagináveis para uma lagarta: já é possível voar!
A DITADURA DA POSITIVIDADE
Agora imagine que por conta do desconforto causado pelo isolamento o organimo da lagarta não entrasse no processo de trasnfor se de repente as lagartas passassem a encarar esse processo como negativo, muito doloroso, trabalhoso, uma perda de tempo, preferindo se manter na zona de conforto. Se passassem a acreditar que o importante é estar sempre no melhor humor possível, pensar positivo, ser a melhor versão de si mesmo, performar 100% sempre em todas as ocasiões, todo santo dia.
Se passassem a julgar o tédio, o silêncio, a tristeza e a crise relacionada à esse processo natural de transmutação a algo negativo e que devesse portanto ser evitado. Se isso acontecesse os processos necessários para se avançar para a próxima fase de ser quem a lagarta realmente é, seriam interrompidos. Não seria possível um dia voar!
PENSAMENTO POSITIVO SEMPRE
O que nossa cultura nos ensina sobre sentimentos como a tristeza, a raiva, o tédio, a ansiedade? Sim, desde pequenos tais emoções são invalidadas, ignoradas e empurradas pra debaixo do tapete. Vivemos a cultura do “engole o choro”, “disfarça a raiva”, “não seja nunca negativo”, “good vibes only”.
A verdade é que assim a conta não fecha, e essa positividade superficial acaba por nos levar à exaustão mental e ao vazio!
O QUE A GENTE RESISTE, PERSISTE
Aquilo que a gente resiste, persiste e feito uma criança que pede atenção, não vai embora enquanto não recebe o que precisa. O ciclo não se fecha, e segue aberto sugando a energia de outros processos que também deixam de acontecer em sua completude. Se não formos capazes de acolher as emoções desconfortáveis, tampouco seremos capazes de experimentar as mais prazerosas em sua totalidade.
Por causa dessa ditadura da positividade que nos incentiva a ignorar e a não dar atenção àquilo que nos causa dor, não processamos e não integramos o lado mais duro e desconfortável dos ciclos: a morte, o envelhecimento, a perda, a tristeza, a raiva.
É impossível estarmos bem o tempo inteiro! A única maneira de isso acontecer seria se vivessemos em uma bolha protegidos das experiências da vida real, ou seja, não rola! Não há solução imediata para as experiência desconfortáveis da vida. É necessário mergulhar, não dá pra ficar só no raso, ou uma hora a repressa estoura, e o estrago geralmente é mais complicado e demanda mais tempo.
A BELEZA DA DOR
Esses sentimentos vistos como “negativos” e “ruins” demandam um tempo de digestão, de ajuste de rotas, que nossa cultura tende a não aceitar. Eles são belos na medida em que nos apontam que algo em nossas vidas precisa mudar para que vivamos vidas mais plenas e satisfatórias.
Olhando por essa perspectiva esses sentimentos podem ser visto como um guia que nos impulsiona em direção à nossa evolução e crescimento pessoal.
Teremos que passar por eles de qualquer forma, então que tal que seja a partir de uma perspectiva mais construtiva, aberta e disposta? Não mergulhar nas nossas vulnerabilidades o tempo necessário para conhecer e abraçar os processos inevitáveis da vida nos torna impotentes e frágeis diante deles. Resistir a tais processos nos enfraquece, pois aquilo que não conhecemos nos assusta e nos assombra.
Nenhum processo de crescimento é imediato. Leva tempo, leva dor, leva ciclo, leva alegria, leva gestações, leva partos, leva tédio, leva choro, leva riso. E traz a capacidade de voar cada vez mais alto!
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Espero que esse texto tenha sido útil pra você 🙂