O colapso, ainda que muito doloroso, pode ser o bilhete de entrada para a transformação que precisamos para viver de forma mais plena e com sentido. A crise é a fresta que se abre quando aquilo que sustentava a vida já não consegue carregar nosso peso real. Ela marca o momento em que as estruturas antigas deixam de ser suficientes.
O objetivo deste texto não é romantizar nem naturalizar abusos ou violências. Essas situações devem ser combatidas de forma veemente. O que buscamos aqui é compreender o que acontece internamente quando uma crise surge e por que ela pode revelar dimensões importantes sobre a nossa própria vida.
Eu colapso, tu colapsas, nós colapsamos
Com frequência, entramos em colapso porque nos moldamos demais às expectativas externas — fazemos o que esperam de nós, priorizamos o que nos dizem ser prioridade e acumulamos papéis que nem sempre refletem nossos desejos reais. Tentamos ser a amiga perfeita, o filho exemplar, a profissional impecável. Mantemos tantas exigências internas e externas ao mesmo tempo que, em algum momento, a estrutura interna não sustenta mais, e então colapsamos.
Mas o colapso também pode vir pelo movimento oposto: quando olhamos apenas para nós mesmos, ignoramos responsabilidades, vínculos e necessidades externas, ou quando reagimos de forma impulsiva e violenta diante do que não sabemos elaborar. Esse tipo de desequilíbrio também se acumula silenciosamente até estourar em forma de crise, como um chamado para reorganizar a relação entre o eu e o mundo.
Em ambos os casos, a crise revela que a forma como estamos vivendo se tornou insustentável.
Conserto rápido ou pacote completo?
Diante da crise, é comum buscarmos alívio imediato. Muitas vezes, a medicação entra como primeira resposta para silenciar o desconforto e restaurar rapidamente o “normal”. É importante reconhecer que, em alguns casos, a medicação é necessária, sim — ela pode funcionar como uma ponte, um apoio provisório para estabilizar o sofrimento. Mas essa decisão precisa ser tomada com cuidado e no momento certo, para que o uso dos remédios não interrompa a possibilidade de enxergar o novo caminho que se abre. Não se trata de demonizar a medicação, mas de evitar que ela seja usada de maneira excessiva ou automática, impedindo o contato com o sentido da crise.
Uma crise não é apenas um defeito na engrenagem. Ela é, muitas vezes, um apelo por saúde — uma tentativa da psique de nos obrigar a olhar para algo que vem sendo ignorado há tempo demais.
A mensagem dentro da crise
A crise é uma intervenção interna. É como se uma parte mais determinada e clara de nós forçasse outra parte — mais resistente e temerosa — a fazer uma escolha que vem sendo adiada. Não é por acaso que a palavra “crise”, do grego krísis, significa distinção, decisão, juízo, separação.
Ela nos mostra que certos caminhos se esgotaram e que prioridades precisam ser revistas. A crise nos convida a escutar necessidades reais que antes não encontravam espaço para existir: descanso, relações mais profundas, autonomia, simplicidade, autenticidade, expressão criativa — e uma vida que faça sentido para nós.
Existe vida após a crise!
A enfermidade é, muitas vezes, o início da cura. Não adoecemos repentinamente; já estávamos adoecendo há muito tempo antes de a crise vir à tona. A crise torna explícito o que estava silencioso. Ela nos convida a abandonar modos de vida nocivos e reconstruir a vida em bases mais genuínas e saudáveis.
Existe vida após a crise — e, muitas vezes, é nesse espaço que encontramos a possibilidade de viver com mais verdade e integridade.
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Espero que esse texto tenha sido útil pra você 🙂